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Documento secreto revela evidências da perseguição a uigures na China

Atualizado: 21 de jun.

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Documento secreto revela evidências da perseguição a uigures na China

"Campo de reeducação" em Hotan, na região de Xinjiang, China. Imagem AFP/G.


Um documento vazado revela que em maio de 2017, um uigur foi preso e levado para um “campo de reeducação” na região de Xinjiang, noroeste da China. O motivo da prisão foi porque sua esposa cobriu o rosto com um véu muçulmano e, por incrível que pareça, por ter “muitos” filhos. Ele nunca passou por um julgamento.


O documento mostra ainda que o homem passou por “uma grande transformação ideológica”, e “percebeu seus erros e mostrou arrependimento”. Para a ditadura chinesa, os seis filhos do homem preso, apresentavam “bom comportamento”. Em junho, a mãe foi presa e cumpriu pena de seis anos, acusada de participar de “atividade religiosa ilegal”.



A história dessa família uigur não é um caso isolado. Centenas de outros casos semelhantes foram descobertos devido ao vazamento de dados que revelaram os motivos das prisões. Alta tecnologia e trabalhadores são usados para monitorar e rastrear identidades, locais, hábitos da minoria muçulmana dos uigures na China.


A DW, juntamente com as emissoras alemãs NDR e WDR e o jornal Süddeutsche Zeitung, traduziram e analisaram a lista de 137 páginas que revela o envio de 311 pessoas para a “reeducação” simplesmente por deixar a barba crescer, jejuar ou pedir um passaporte. Segundo o documento, centenas de pessoas ligadas aos prisioneiros também foram levados para os campos de concentração, incluindo crianças.


Pequim afirma que as prisões seriam e medidas contra os uigures seriam para combater o extremismo, mas não há nada no documento indicando combate ao extremismo. O que existe de suspeito seriam três pessoas na lista que pertenceriam à organização islamista Hizb-ut-Tahrir. O que ficou evidente na lista foi que a China persegue sistematicamente a minoria devido à sua opção religiosa e sua cultura.


Após um ataque a bomba na capital de Xinjiang em maio de 2014, as autoridades chinesas implantaram um sistema de monitoramento e criaram campos de detenção em massa, chamados oficialmente de Centros de Treinamento em Formação Profissional.


Segundo um relatório secreto alemão de dezembro de 2020, dos 10 milhões de uigures que moram na China, pelo menos 1 milhão foram detidos e levados para os campos de “reeducação”.


Para as autoridades chinesas, esses campos são uma ferramenta efetiva na luta contra o terrorismo. Mas a lista de presos não indica que a capital tenha como alvo, potenciais terroristas. Observadores internacionais de direitos humanos alertam para uma situação que eles mais temiam: uma empreitada sistemática de aspecto ético e de encarceramento arbitrário.



O documento secreto mostra pequenos detalhes do monitoramento de download de um vídeo há seis anos ou mensagens trocadas no WeChat com familiares e amigos no exterior. A lista revela ainda que os uigures são submetidos a métodos extremamente rigorosos de monitoramento e prisão. Suas famílias são controladas por uma rede sofisticada de espiões, visitas repetidas às suas residências e excessivos interrogatórios coletivos.

Ao analisar a lista, observou-se que ela contém nomes completos, números de identificação e dados do comportamento social de mais de 1,8 mil familiares, vizinhos e amigos dos 311 uigures detidos. Outras cenas de pessoas aparecem na lista, mas com menos grau de coleta de dados. O documento agrupa casos de uma região da China que está localizado na fronteira entre a Índia e Tibete, onde vivem cerca de 650 mil habitantes e onde está localizado cinco destes campos.


Esse Novo documento foi enviado em novembro de 2019 a DW pelo informante Abduweli Ayup, um uigur exilado na Noruega, que recebeu de uma fonte anônima. O recente vazamento não está em PDF e não tem carimbos oficiais ou assinatura, mas é semelhante aos “Papéis de Xinjiang”, revelados pelo The New York Times, e pelos “China Cables”, publicados pelo ICIJ (Consórcio Internacional de Jornalistas Investigativos).



Para o especialista político Rian Thun, da Universidade de Nottingham, essa espionagem da vida privada é “impressionante” na riqueza de detalhes. "É interessante imaginar que essas coisas existem além de Xinjiang. Os dados devem ser espantosos".


Os uigures nos campos dependem dos atos de quem está em liberdade. Em alguns casos, o comportamento dos parentes é usado como referência direta para uma provável soltura.


A lista mostra a história de um homem detido em maio de 2018 por falar com seu irmão que havia fugido para a Turquia. O documento mostra que ele representava “certo nível de perigo para a sociedade” e a recomendação da “comunidade” seria mantê-lo “numa fábrica nos campos de reeducação”. Vários desses casos apontam para um sistema de trabalho forçado em fábricas na China.


Um dos motivos mais utilizados para a prisão é a violação da política oficial de natalidade. Conforme a legislação da China, uigures e outras minorias viventes em regiões urbanas podem ter apenas dois filhos e os das áreas rurais, três. O que chama a atenção dessas fábricas, nos campos de “reeducação”, é uma maior detenção de homens com relação ao de mulheres por ter mais filhos que o permitido.



Essa desigualdade poderia indicar que a ditadura chinesa avalia os homens como sendo a principal ameaça na região. "Em termos de islamofobia, homens em geral, especialmente os mais jovens, são sempre alvos e vistos como potenciais terroristas", afirma Darren Byler, especialista da Universidade de Colorado.


O documento aponta que o governo chinês tem como alvo principal os mais jovens entre os homens uigures. Para os nascidos entre os anos de 1980 e 2000, o termo usado é “pessoa não confiável”. As pessoas que foram levadas para os campos de “reeducação” em sua maioria tinham entre 20 e 40 anos.


Muitos dos presos listados no documento secreto foram detidos por fazerem uma peregrinação muçulmana em Haji ou Meca. Em ao menos 50 casos, uigures foram presos por solicitar um passaporte.



A suspeita sobre a ditadura chinesa está perseguindo muçulmanos não para por aí. O governo chinês do ditador Xi Jinping classificou 26 países como “sensíveis”, quase todos esses países são de maioria muçulmana, como Argélia, Paquistão e Arábia Saudita, ou ainda o vizinho Cazaquistão, onde muitos uigures têm família, além de laços culturais e étnicos. Qualquer forma de comunicação com esses lugares é considerada uma ameaça e passível de detenção.


"Se o Partido Comunista Chinês for capaz de eliminar a influência do islã em todos os elementos da vida uigur, a cultura desta minoria certamente será esvaziada", disse Timothy Grose, do Instituto de Tecnologia Rose Hulman, nos Estados Unidos.


Segundo especialistas, o governo de Pequim só irá parar quando extinguir as raízes religiosas e culturais de uigures e outras minorias muçulmana em Xinjiang.



Fonte (s): DW e BBC

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