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As causas da Expansão Marítima portuguesa

Atualizado: 3 de abr. de 2023

Artigo


As causas da expansão marítima na Europa - História em Destaque

Mapa-múndi de JM Contarini, 1506, representando os horizontes em expansão. Museu Britânico.


Em história do Brasil, aprendemos desde cedo, em casa e na escola que o Brasil foi descoberto por Pedro Álvares Cabral em abril de 1500. Esse fato se deu devido à expansão marítima portuguesa, iniciada no começo do século XV.


Nessa época a Europa começava a se modificar pela expansão da agricultura e do comércio. O continente europeu era uma região extremamente rural, onde as cidades haviam retrocedido e o comércio diminuído consideravelmente. Ao mesmo tempo, houve uma descentralização e fragmentação do poder político, apesar da história do Império ainda proporcionar certa conexão cultural e mesmo legal a toda a região.



Expansão da Europa

O crescimento agrícola foi possível graças à expansão de novas áreas cultivadas, com o desmatamento de florestas, a drenagem de pântanos e o incentivo para ampliar o comércio. As cidades começaram a crescer e a se transformar em ilhas de relativa liberdade, reunindo artesãos, comerciantes e antigos servos que buscavam uma alternativa de vida, fugindo dos campos.


Todo esse crescimento da Europa ocorreu num período conhecido como Baixa Idade Média que se estendeu do século XI ao século XV. Nele a Europa Ocidental conheceu o auge do feudalismo, a sua decadência e o nascimento de uma nova organização política, econômica e social.


Na esfera social, esse período não diferiu da Alta Idade Média, com os três grandes grupos que eram a nobreza, formada pelos reis e nobres; o clero, composta por representantes da Igreja; e os camponeses, que trabalhavam nas terras que pertenciam à nobreza. Era uma sociedade marcada por pouca ascensão social.



O feudalismo é a base para entendermos o funcionamento da sociedade europeia na Baixa Idade Média. Ele não se refere apenas ao seu sentido econômico de exploração da terra pelos camponeses, e a relação entre servos e o senhor feudal. O feudalismo envolve aspectos: político, social e ideológico.


Foi uma época de crescimento urbano e comercial, que consolidou o poder dos reis, de formação de Estados Nacionais, de nascimento de línguas nacionais etc.


A posição do camponês estabelecido no feudo era de servidão e não poderia abandonar a terra. A posição do senhor feudal era hereditária, portanto, passada aos filhos, e o camponês tinha de ressarci-lo pelo direito de usar a terra e as instalações nela. O poder do senhor feudal de possuir e explorar a terra e cobrar impostos vinha da relação de vassalagem que ele tinha com o rei.


Os mercadores ampliaram as atividades comerciais a partir do século XI, se deslocando de uma região para outra, vendendo seus produtos. No século XII, esses comerciantes criaram as feiras, principalmente na região da atual França, Itália e da Bélgica. Elas exerceram o importante papel de interligar quase todo o continente europeu com o continente africano e asiático.


A partir do século XIII, diversas fronteiras da Europa foram definidas por uma série de batalhas travadas principalmente por França, Inglaterra e Espanha. Muitos desses limites permanecem quase os mesmos até hoje. Em meio a essas definições de fronteiras, foi crescendo o Estado como uma organização política centralizada, tendo como figura dominante, o príncipe e a burocracia em que se apoiavam. Esse processo durou séculos e alcançou seu ápice entre 1450 e 1550.



Houve também uma expansão geográfica da Europa cristã, pela reconquista de territórios ou a ocupação de novas regiões. A Península Ibérica, que havia sido conquistada pelos muçulmanos, foi retomada por reinos cristãos; os cruzados ocuparam Chipre, no leste do mediterrâneo, a Palestina, a Síria, Creta e as ilhas do Mar Egeu; houve expansão inglesa na direção do País de Gales, da Escócia e da Irlanda; no leste, alemães e escandinavos conquistaram as terras do Báltico.


O comércio na Europa ganhou apoio definitivo com o início das Cruzadas no final do século XI. A movimentação de soldados para o Oriente e a migração de milhares de pessoas com o desejo de se estabelecer na Terra Santa abriram o mercado oriental cujas mercadorias eram luxos desejados pela Europa Ocidental.


No início do século XIV, uma crise profunda se instalou durante esse avanço. Nesse período, ocorreu um aumento intenso da exploração dos camponeses que desencadeou diversas rebeliões ao longo dos anos, em regiões como o norte da Itália na passagem do século XIV; a Dinamarca (1340) e a França (1358). Houve uma série de guerras internas, levando a divisão da nobreza. Também ocorreu uma grande queda da população, escassez de alimentos, epidemias; a mais famosas delas foi a Peste Negra entre 1347 e 1351. Consequentemente, grandes áreas ocupadas por camponeses foram abandonadas e aldeias inteiras desapareceram.


Foi a partir do século XV, que os portugueses e espanhóis iniciaram um processo intenso, que ficou conhecido como Expansão Marítima. Essa ação também foi chamada de as Grandes Navegações e tinham como objetivos: a aquisição de riquezas tanto pela exploração da terra quanto pela escravidão (africana e indígena), pelo anseio de expansão territorial, pela difusão do cristianismo para outras civilizações e também pelo desejo de aventura.



Expansão Marítima

Por que Portugal iniciou pioneiramente a expansão no começo do século XV, quase cem anos antes que Colombo, enviado pelos espanhóis, chegasse às terras da América?


Para responder essa questão, é preciso considerar uma série de fatores. O fato do Infante Dom Henrique (1394 – 1460) e de sua Escola de Sagres ter importante papel no incentivo à expansão, é visto hoje com polca relevância. A princípio, Portugal se consolidava no bloco europeu como um país autônomo, com intenção de ampliar-se além da Europa. Os portugueses acumularam larga experiência ao longo dos séculos XIII e XIV na comercialização em longas distâncias. O envolvimento com o mundo islâmico do Mediterrâneo, onde havia um crescente avanço na utilização de moeda como meio de pagamento, facilitou a experiência comercial de Portugal.


Outro incentivo para a expansão marítima foi a sua posição geográfica – próximo às ilhas do Atlântico e à costa da África. Nessa época era importante contar com correntes marítimas favoráveis, e elas começavam exatamente nos portos portugueses ou localizados no sudoeste da Espanha.


É considerado também um fator importante o modo como Portugal enfrentou à crise geral da Europa Ocidental. O país traçou estratégias políticas melhores do que a de outros reinos como o da França, Inglaterra, Espanha e a Itália. No século XV, todos esses reinos citados anteriormente, estiveram envolvidos em guerras e problemas dinásticos, ao contrário de Portugal, que foi um reino unificado e menos sujeito a disputas.



Essa unificação e consolidação da monarquia se deu através de uma história que teve um dos pontos mais significativos durante a revolução de 1383 a 1385. Entorno da sucessão ao trono português, a elite burguesa comercial de Lisboa se revoltou. Seguiu-se uma enorme insurreição popular, semelhante a outras revoltas no ocidente europeu na mesma época, mas com desfecho diferente das revoltas camponesas esmagadas em outros países. Quando o rei de Castela, apoiado pela nobreza lusa, entrou em Portugal para assumir o trono, a sucessão dinástica confundiu-se com uma guerra de independência. No confronto, Dom João, filho bastardo do Rei Pedro I, assumiu o poder e, simultaneamente, a independência portuguesa foi firmada. Dom João, conhecido como Mestre de Avis, foi uma figura central da revolução de 1383.


Dom João, conhecido como Mestre de Avis, colocou em prática uma política que reagrupou vários setores sociais influentes da sociedade portuguesa: os comerciantes, a burocracia, a nobreza. Esse fato é colocado como um dos pontos fundamentais para a expansão portuguesa.



Na época, o Estado, ou propriamente a Coroa, detinha o poder de grande empreendedor, se alcançasse as condições de força e estabilidade para tanto. É importante salientar que no início do século XV, os interesses de várias classes, grupos sociais e instituições que compunham a sociedade em Portugal estavam voltados para a expansão. Para os grupos interessados era uma oportunidade de um ótimo negócio; para o rei era uma grande oportunidade de novas fontes de receita quando os lucros da Coroa tinham diminuído consideravelmente. Era também uma ótima forma para os nobres e membros da Igreja, servir ao rei e a Deus cristianizando os “selvagens”, que resultava em recompensas e em cargos cada vez mais raros na Metrópole; lança-se ao mar significava emigrar, partir em busca de uma vida melhor e fugir de opressões do sistema.


Ocorreu em Portugal uma valorização e centralização do poder real, onde os reis portugueses resistiram em renunciar a seus direitos reais em função dos proprietários de terras.


Em 1487, Afonso de Paiva e Pero da Covilhã deixaram Portugal como encarregados de Dom João II para encontrar o reino do Preste João. Segundo a lenda, o Preste João descendia dos Reis Magos e era inimigo dos muçulmanos. Essa lenda fazia parte do imaginário europeu desde meados do século XII, e construída a partir do registro real – a existência da Etiópia, no leste da África, onde vivia uma população negra que haviam adotado um ramo do cristianismo como sua religião.


As fantasias e os sonhos associados à aventura marítima não devem ser colocados como uma forma de encobrir o interesse material. Não há dúvida de que o interesse material prevaleceu, sobretudo quando os contornos do mundo foram sendo cada vez mais conhecidos e questões práticas de colonização entraram na ordem do dia.



Lista cronológica das navegações portuguesas

1415 – Chegada à Ceuta, no norte da África.

1419 – Ocupação da Ilha da Madeira.

1431 - Gonçalo Velho chega aos Açores.

1434 – O Cabo Bojador é superado pelos navegadores

1444 – Descoberto o arquipélago de Cabo Verde.

1471 - Ocupação as ilhas de são Tomé e Príncipe

1482 – O navegador Diogo Cão entra no rio Congo e estabelece contatos no território de Angola

1488 – Bartolomeu Dias dobra o Cabo da Boa Esperança.

1498 – Vasco da Gama atinge Calicute, na costa oeste da Índia.

1500 – Pedro Álvares Cabral oficializa a existência de terras no sul da América e segue rumo à Ásia, objetivo final da esquadra.

1500 - Em 10 de agosto, Diogo Dias encontra a ilha de Madagascar.

1505 - Os portugueses assinam um tratado com os governantes do Ceilão (Sri Lanka).

1507 - A ilha de Ormuz (atual Irã) é atacada por Alfonso de Albuquerque

1510 - Tomada de Goa por Alfonso de Albuquerque.

1511 - Francisco Serrão aporta em Malaca (Malásia).

1512 - Chegada dos portugueses a Timor.

1543 - Estabelecida as relações comerciais entre portugueses e japoneses.

1557 - As autoridades chinesas permitem os portugueses a ficarem em Macau.


O desenvolvimento das técnicas de navegação

Em termos gerais, a expansão marítima portuguesa representou uma importante renovação das técnicas de navegação. Quando tiveram início as viagens portuguesas rumo à Guiné, as cartas de navegação não indicavam ainda latitudes ou longitudes, mas apenas rumos e distâncias. Foi na Escola de Sagres que se desenvolveram novos estudos sobre técnicas de navegação, e com o aprimoramento de instrumentos como o quadrante e o astrolábio, que ajudaram na localização do navio pela posição dos astros, representou uma importante inovação da época. Os portugueses inovaram o tipo de arquitetura naval com a construção da caravela, utilizada a partir de 1441. Esse tipo de embarcação era veloz e leve para a época, de pequeno calado, permitindo aproximar-se bastante da terra firme e evitar o perigo de encalhar.


A atração portuguesa pelo ouro e pelas especiarias

É fácil compreender o interesse português pelo ouro, ele era amplamente utilizado como moeda e na decoração de templos e palácios dos aristocratas asiáticos. Já a atração pelas especiarias se deve ao fato de que a palavra especiaria se associa à ideia de produto raro, utilizado em pequenas quantidades. A palavra especiaria vem do latim especia, usada pelos médicos para designar “substância”. Produtos como a noz-moscada, o gengibre, a canela, o cravo e a pimenta eram considerados especiarias, assim como o açúcar, mas devido ao seu consumo em massa, deixou de ser.



Na Europa Ocidental da Idade Média a civilização consumia grande quantidade de carne. Enormes quantidades de gado eram abatidas quando as forragens se tornavam escassas no início do verão. Essa carne era conservada usando sal, exposta ao sol ou defumada. Para disfarçar o seu cheiro forte e desagradável era usado a pimenta e outras especiarias. Havia também uma espécie de hierarquia no seu consumo: na base, condimentos como o alho e a cebola; no topo, os mais finos, com odores aromáticos, suaves.


O ouro e especiarias foram os bens mais procurados nos séculos XV e XVI, mas havia outros, como os corantes, o peixe, a madeira, as drogas medicinais e, pouco a pouco, os escravos africanos.


A ocupação da costa africana e as feitorias

A conquista da cidade de Ceuta, no norte da África, em 1415, é considerada o início da expansão marítima portuguesa. Alguns historiadores acreditam que os principais objetivos da conquista eram abrir caminho na procura por ouro no Sudão e controlar incursões piratas dos árabes nas costas de Portugal.


O reconhecimento da expansão ao longo da costa ocidental africana e nas ilhas do Oceano Atlântico não se fez da noite para o dia. Da ultrapassagem do Cabo Bojador por Gil Eanes (1434) até a traiçoeira e temida passagem do Cabo da Boa Esperança por Bartolomeu Dias (1487), levou 53 anos. A chegada no Oceano Indico permitiu que de Vasco da Gama chegasse às Índias. Depois, os navegantes portugueses chegaram a China e o Japão, onde tiveram considerável influência. Historiadores japoneses chamam o período entre 1540 e 1630 de “século cristão”.


Ao longo dos anos os portugueses foram constituindo uma série de feitorias na costa, que eram postos bastantes fortificados de comércio. Um indivíduo chamado feitor dirigia a parte comercial do núcleo. Ele era encarregado de realizar compras de mercadorias dos chefes ou mercadores nativos e armazená-las, até que os navios portugueses viessem recolher e transportar para a Europa. Esse modelo de feitoria praticamente descartava a necessidade de colonização do território.



Mesmo não permanecendo na costa, a Coroa estabeleceu o monopólio real sobre todas as transações com ouro, forçando a cunhagem de moeda em uma Casa da Moeda. Em 1481, foi criada a Casa da Mina ou Casa da Guiné, um tipo de alfândega para o comércio africano. Os navios portugueses partiam da costa ocidental da África com pequenas quantidades de ouro em pó, marfim, e uma variedade de pimenta chamada malagueta e, a partir de 1441, foi incluído o transporte de escravos.



A ocupação das ilhas do Atlântico

A história da ocupação das ilhas do Atlântico é bem diferente do que ocorreu na África. Após disputar com os espanhóis e perder para eles a posse das Ilhas Canárias, conseguiram implantar seu sistema nas outras ilhas: na Madeira, por volta de 1420, nos Açores, em torno de 1427, nas Ilhas de Cabo Verde, em 1460, e na de São Tome, em 1471. Na Ilha da Madeira, dois sistemas agrícolas paralelos competiram pela predominância econômica. O cultivo tradicional do trigo atraiu um número considerável de modestos camponeses portugueses, que tinham a posse de suas terras. Diferentemente do que ocorreu na África, a ocupação das ilhas do Atlântico serviu para os portugueses realizarem experiências expressivas de plantio em larga escala, empregando trabalho escarvo. Ao mesmo tempo, baseadas no trabalho escravo, surgiram as plantações de cana-de-açúcar, estimuladas por mercadores e comerciantes genoveses e judeus. A economia baseada na produção de açúcar teve breve êxito. Os portugueses implantaram um sistema de grande lavoura de cana-de-açúcar, nessa ilha, situada no Golfo da Guiné. Próximo das feitorias na costa da África, a ilha contou com um abundante suprimento de escravos. Segundo escritos de 1554, chegaram a existir na ilha engenhos com cerca de 150 a 300 cativos. No século XVII, quando a produção açucareira atravessou tempos difíceis, a ilha de São Tomé foi um importante entreposto de escravos vindos do continente para serem distribuídos na América e Europa, se tornando uma atividade principal.



Bibliografia

MICHELAN, Kátia Brasilino. A expansão marítima portuguesa e a tomada de ceuta (1415): uma narrativa acerca da construção de marcos históricos. Appris Editora, 2018.

BOXER, C.R. O Império Marítimo Português: 1415-1825. Edições 70, 2011.

FAUSTO, Boris. História do Brasil. Edusp, 2019.

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